O abraço
Lembro-me de que aqui há uns anos, numa rua perto do meu antigo escritório, onde apareciam alguns desvalidos da sorte a estender a mão à caridade, ter encontrado um indivíduo de meia-idade, com ar limpo e com a mão estendida e que interpelava os passantes; de imediato e, mecanicamente, meti a mão ao bolso, talvez com o intuito de não ser mais importunado. Recordo que olhou para mim e me disse, numa voz suave e pausada: "Eu não quero esmola, meu senhor, mas um abraço, pois faço hoje anos".
Dei-lhe um abraço e recebi o seu abraço. Penso que foi a maior "esmola" que dei até hoje e a maior recompensa que até hoje recebi.
Aquele homem, faminto de afetos, sentiu-se menos só e um pouco feliz, porque alguém o tinha abraçado e felicitado, como tanto desejava: não pedia grandes coisas, apenas afetos.
Não sei porquê, imaginei o dia do seu nascimento quando ainda não fazia anos, mas se preparava para fazer horas e dias; a alegria que por certo os pais sentiram e o carinho com que toda a família o recebeu; depois pensei ainda nas agruras da vida que teve de vencer e o venceram, a falta de afetos, a solidão que o cercou, a indiferença a que o votaram, o vazio do seu quarto...
Pensei, também, no valor de uma palavra ou de um gesto, na dimensão e mistério do amor que tantas vezes nem entendemos...
Quem sabe se não andaremos nós, também, à procura de abraços e olhares que nos olhem e de uma mão que se nos estenda, porque começamos a ter menos gente à nossa volta no dia do nosso aniversário e o frio a flagelar-nos… Um abraço, um simples abraço nem que seja transformado em um sorriso...
ANI (adapt.)
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