Arca Encantada
Arca encantada
( Eugénio de Sá )
De dúbio dom dos céus ataviado
Arroubos sinto em mim pra poetar
Cousas que aos demais hão de levar
Entrechos que me trazem enlevado.
Não falo de salões resplandecentes
Com mil lustres de cristal acesos
Refiro-me a palavras que os meus dedos
De tantas escrever, ficam dormentes.
Palavras que ficaram na garganta
Porque delas falar me pareceu
Que se as dissesse não seria eu
Mas de escrevê-las a vontade é tanta.
É, pois, c'o cerne - já se adivinhou -
Ao que venho, e as trago a estas linhas
Aqui as deixo nas expressões minhas
Aqui as têm, à fé de quem sou:
Est' alma que se encontra dividida
Entre um país pequeno, acolhedor
E outro tão bonito e bem maior
Onde aportou há pouco a minha vida.
Nem só da geografia a gente vive
Mas também d'outras cousas encantadas
Que na alma guardamos, bem guardadas
Eu sei, posso dizer, sempre lá estive.
É ness' arca que habita a saudade
Dos nossos entes queridos já ausentes
Lá vivem sentimentos bem latentes
D'outros encantos da nossa mocidade.
É ampla a nossa alma, e imortal
Cabem lá tantos sonhos, tanta esperança
Mas não há só quimeras e bonança
Na dimensão da índole ancestral;
Ali confrontos há, bem poderosos
Entre as forças do bem e as do mal
E o bem, porque é de Deus, e é leal
Às vezes cai em ardis tenebrosos.
Inda há palavras pra fechar meus versos
A lembrar desta alma o seu melhor;
Vontade e fé, que tenho por penhor
De que a ventura volte a ter sucessos.
Outro fosse eu, que não um trovador
C'o peito ressobrando gratidão
E omitiria a voz desta razão
Que exige que confesse o meu amor,
Amor a este povo meu irmão
Que um dia as naus de Cristo descobriram
E aos poucos nele viram e sentiram
Que ser fraterno é sua vocação.
( Arca encantada foi escrita no Brasil,
despontava então o ano de 2007 )
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