A máscara
Por acaso, parou na minha frente,
De loup e dominó de seda negra,
Uma mulher d'olhar resplandecente
E mento breve de figura grega.
Tomei-lhe as mãos esguias entre as minhas...
E os seus olhos doirados reluziram
Como os punhais ao sol, quando se tiram,
Aguçados e frios, das bainhas.
- Máscara, quem és tu?
- E tu quem és?...
- Um homem que te viu e te deseja...
E um riso vago, de desdém talvez,
Floriu na sua boca de cereja.
Ergui-lhe as mãos ascéticas. Beijei-as.
Em vibrações entrecortadas, secas,
Tiniam taças irisadas, cheias.
E uma frase d'amor, toda em colcheias,
Vibrava nas arcadas das rebecas.
Levei-a para o vão duma janela.
- Máscara, quem és tu?
- Para que insistes?...
Outro riso subiu da boca dela
Aos olhos enigmáticos e tristes.
E descobriu a face. No capuz
Emoldurou-se um rosto lindo e sério.
Que diferente porém do que eu supus!
A gente nunca deve entrar com luz
Nos divinos recantos do mistério...
Augusto Gil, poeta português
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