Sofrer por antecipação? Um contra-senso!
Sofrer por antecipação? Um contra-senso!
Um apontamento de Eugénio de Sá
E havia aquele senhor inglês, um capitão de industria, que tinha o salutar hábito de jogar golfe em Oxfordshire todos sábados.
Num desses sábados apareceu no campo de golfe, espavorido, um dos seus funcionários que lhe disse, ofegante: senhor Williams, a sua fábrica está a arder!
O fleumático homem parou, encostou-se ao taco número cinco que estava a utilizar, e respondeu calmamente: que pena, John, vou ter um enorme problema para resolver na
segunda feira!
Não defendo que todos tenham de ter o sangue frio próprio de um réptil ou de anfíbio, ou nem sequer a exagerada calma do tal senhor Williams, mas, como terá dito Jesus Cristo ao aperceber-se deste tipo de sofrimento humano: « Basta! - a cada dia seu próprio mal ».
Quem não sofreu já por antecipação perante a pendência do resultado de um exame médico, de uma decisão de um conflito laboral ou pessoal, pela anunciada e indesejável visita de alguém que o antagoniza, ou até de um caso de amor mal resolvido, ou ainda por muitíssimas outras situações que seria fastidioso continuar aqui a enumerar?
Na realidade, todos os dias o ser humano é confrontado com o conhecimento da proximidade de situações que, à partida, adivinha o vão incomodar, se não mesmo traumatizar. Todavia, também todos conhecem o conselho tido por acertado de que se deve dormir sobre um problema, porque esse problema no dia seguinte será visto de forma menos dramática, e, dia após dia, ver-se-á acentuar-se essa tendência, ou quiçá se resolverá por si mesmo, como pó que tempo diluiu.
A vida é algo maravilhoso que nos foi concedido para que a desfrutássemos o melhor que saibamos e possamos. E, embora a existência gere sofrimentos inevitáveis em consequência das perdas que sofremos e das doenças que nos afligem a nós e aos que nos são mais próximos - com o respectivo rol de afectações físicas e morais, como a amargura e a angústia - é grande a nossa capacidade de aceitação e de regeneração perante (quase) todas as contrariedades com que vamos sendo confrontados.
A questão está em que o ser humano tem uma natural tendência para o sofrimento, para a vitimização, mesmo antes que ocorram os factos que a tal possam levar. A tal ponto isto é verdade, que, se uma ameaça parece estar prestes a acontecer, e não sofremos por antecipação, algo nos parece estar errado connosco.
Sofrer, chorar, desesperar por alguém ou por alguma coisa, são sentimentos aceitáveis num ser humano, e é isso que faz de cada um de nós uma "pessoa", com a sensibilidade que se pode esperar dessa condição civilizada. Mas ficar sofrendo antes da hora, antecipando um futuro que pode nem vir a acontecer, parece coisa doentia, passível de conduzir-nos a estados mentais muito negativos que nos podem impedir de gozar o que a vida tem de melhor para oferecer.
Aqui chegado, diria que todos devemos procurar viver em harmonia com a natureza e com os animais que a povoam, livres e felizes, sem complicar o que à partida é simples e natural, sendo tranquilos como os regatos que fecundam os campos e as flores que os decoram e nos encantam.
Seja optimista e positivista, leitor amigo. Deixe-se levar pela vida, embora procurando sempre conhecer o chão que pisa.
Sintra, Portugal
5.Abril.2018
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