A VOZ COM QUE ME CHAMO
Vivemos na ‘ sala de espera ‘ que escolhemos, e mudamos
frequentemente de poltrona, procurando, quiçá, uma visão diferente
da que se nos oferece a cada momento. Mas, não obstante, o jogo de
sombras em que vivemos sempre há-de contrastar com a luz que
adivinhamos lá fora. E depois, o hermetismo da porta da ‘ sala’ que
mantemos fechada, ajuda a que a sensação de um isolamento
claustrofóbico nos mantenha num perigoso limbo que ameaça
conduzir-nos a estados depressivos que fazem perigar a nossa
integridade mental.
Este pretenso diagnóstico existencial, não podendo ser obviamente
comum - porque cada caso é um caso - e sendo embora demasiado
abrangente e vago, pretende, outrossim, alertar para o ambiente de
que procuramos envolver-nos por natural instinto de auto -
-conservação face ao que imaginamos que possa esperar-nos “lá
fora”. São tempos difíceis os que vivenciamos.
A voz com que me chamo
Eugénio de Sá
A voz com que me chamo é alterada
Não fui eu que me quis inconformado
Nem foi a minha alma amargurada
Que distorceu as notas do meu fado!
A mudez dos meus lábios também não
Sacudiu de torpores um mau-olhado
E a pergunta me aflui: quem foi então
Que me quis ver assim…desesperado?
Só posso deduzir que fui só eu
Quem pintou os meus dias cor de breu
Quem fez de mim o pouco que hoje sou.
A voz com que me chamo já cansou
Neste peito morreu o mais que amou:
O sopro da razão que era só meu.
_______________________________________
A memória guardará o que valer a pena.
A memória sabe de mim mais que eu;
e ela não perde o que merece ser salvo.
Eduardo Galeano
Sintra, 14 de Agosto de 2018
|
Comentários
Postar um comentário
Sua participação é muito bem-vinda!